segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Canção Adolescente

Eu quis fazer uma canção adolescente
que não fôsse aborrecente              
que resolvesse todo o QUIZ           
e todos os XIS dos problemas      
e preservasse o lado inocente de viver
Não imaginava que fôsse tão difícil 
como encontrar a figurinha carimbada
do álbum ilustrado                         
ou solucionar o cubo mágico       
Fazê-la sem sê-la tão conivente
a interesses tão mesquinhamente adultos
- malditos vultos - estraga-prazeres      

Eu quis fazer uma canção adolescente
com a cara de fracasso de Charlie Brown
e as peripécias de Snoopy                  
e a elasticidade do estilingue          
que só atinge o canto dos pássaros
e assim abafar os resmungos de Marcie

com doces colibris beijos               
e extirpar os fungos com novas flores
e fazer o amor sobrepor o bolor do rancor
no vapor de uma réplica de locomotiva  
emotiva a todos os trilhos               
Eu quis trazer de volta                
na revolta desses tempos duros e cruéis
a algazarra das matinés                      
quando assistia pela oitava vez consecutiva
os Reis do Iê-Iê-Iê                                    
Eu quis lembrar todos os volteios          
todos as opções                                 
enquanto olhava os encaixes          
do meu canivete de escoteiro     
todos os ensaios                       
para tentar tocar os seus dedos
Eu quis ser natural como um banho de rio                
como a água que jorra de uma cachoeira
Eu quis lhe surpreender como uma chuva de verão                                              
tão natural qual o esvoaçar da crina de um cavalo                                  
no resvalo do vento vâssalo
Eu quis girar o carrossel 
e ser o corcel que você escolheu
para flutuar os seus sonhos     
Eu quis fazer uma cançaõ adolescente
despreocupada e inconsequente       
sem justas causas e prováveis efeitos
apenas o encanto efêmero de uma brincadeira                         
Uma canção de acordes básicos
e doces melodias               
Uma canção fácil que virasse o dia
seguisse a noite em sonho ou vígilia
e no assobio do banho matinal     
que se integrasse ao cereal        
ao espêsso mel e à mordida da maçã
atraentemente vermelha            
que fôsse absorvida por um sorriso
que trouxesse em um canto da boca
o lado erótico e sensual             
e no outro canto o lado emotivo e de espanto                                     
de quem se prepara para o primeiro beijo
Um som que pulasse como um grilo
e a tocasse como o bote fatal de uma serpente                                    
Uma canção em que eu pudesse vê-la
no céu da minha imaginaçaõ
e gravá-la para sempre     
no Jinglebox do meu coração...
e a ficha se viciasse nessa canção


Carlos Gutierrez




inspirada no recente CD IÊ-IÊ-IÊ
de Arnaldo Antunes
Gravadora Rosa Celeste

Nenhum comentário:

Salve